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O futuro da TV aberta no Brasil: ainda incerto

Passados quase três anos do texto que publiquei aqui mesmo neste espaço (clique aqui para ler), sobre o futuro da TV aberta no Brasil, pouca coisa mudou, e de fato, o padrão escolhido e as políticas de comunicação adotadas tinham mesmo esse objetivo. Pouca coisa mudou e pouca coisa irá mudar ainda nos próximos anos. Tempo necessário para que as emissoras possam se adequar aos novos tempos, novas tecnologias e novos modelos de negócio.

Pelo que pode ser lido na imprensa especializada e apresentado nos congressos da área, as emissoras de televisão brasileiras (leia-se TV Globo) vem se posicionando estrategicamente buscando manter o modelo de negócios (comercialização dos espaços publicitários) dando mostras de que a TV aberta irá conviver harmoniosamente com as novas plataformas e serviços de distribuição de conteúdo audiovisual.

A estratégia da TV Globo, vem se estruturando desde sua quase falência em 2002 por conta da sua investida na Globo Cabo e vem focando suas forças na produção de conteúdo, conforme demostra Gustavo Gindre, do Observatório do Direito à Comunicação:*


"Trata-se praticamente da conclusão de um processo que se iniciou há mais de dez anos, quando a Globo entrou em crise, incapaz de pagar suas dívidas. A decisão, então, foi manter o controle familiar do grupo (sem ceder participação patrimonial aos credores), mas vender quase tudo o que não estivesse relacionado diretamente com a produção de mídia.
Foram vendidas fazendas, uma financeira (Roma), uma construtora (São Marcos) e vários outros negócios, muitos deles ligados à comunicação. A Globo deixou o controle da subsidiária da NEC no Brasil, praticamente encerrou as atividades de sua gravadora Som Livre, fechou a distribuidora Globo Vídeo e o varejo da Globo Disk, saiu da Teletrim, da TV portuguesa SIC e da Maxitel (atualmente parte da TIM), vendeu a empresa de telecomunicações Vicom e a gráfica Globo Cochrane e liquidou o sonho de uma operadora de parques temáticos. [...] Na crise a Globo não esteve sozinha. Praticamente todos os grandes grupos de mídia brasileiros também reduziram suas ambições neste mesmo período. Hoje, a Globo tem receita líquida anual maior do que a soma de Record, SBT, Grupo Bandeirantes, RedeTV, Folha de São Paulo, Grupo OESP, UOL, RBS e Abril. Adversários como JB e Manchete ficaram pelo caminho". 

Mas a estratégia da empresa não se resume apenas em focar na produção de conteúdo. A emissora está focada na convergência tecnológica e na massificação do novo hábito de consumo televisivo por parte das gerações mais novas que é assistir televisão navegando na internet seja pelos notebooks, tabletes ou Smartfones. Entretanto esse é um novo jogo, com jogadores de peso como as empresas de telefonia, as empresas de tecnologia (Google, Apple, etc.), a TV conectada, TV paga e as prestadoras de serviços OTT (over the top). Ainda citando Gindre:

O cenário é completamente diferente quando se analisa os adversários estrangeiros.
Enquanto vendia a NET Serviços para Carlos Slim, a Globo assistiu a Televisa impedir o mesmo Slim de entrar no mercado mexicano de TV a cabo ao mesmo tempo em que investia no mercado de telefonia celular (Lusacell) e nos consumidores hispânicos que vivem nos Estados Unidos. Mas, os maiores temores da Globo não estão na América Latina.
A família Marinho teve forças para impedir que a TV aberta brasileira se tornasse interativa (mesmo tendo que praticamente banir o uso do middleware brasileiro conhecido como Ginga). Mas, ela não pode lutar contra o fenômeno das smartTVs e da chegada do video on demand. Com isso, empresas como Samsung, LG, Sony, Google, Apple e Amazon, que até então atuavam em outros mercados, passaram a disputar a audiência brasileira, em um fenômeno que só tende a crescer nos próximos anos. Mas, há dois outros adversários ainda mais próximos. Se é poderosa no mercado nacional, a Globo não tem porte para enfrentar as operadoras de telecomunicações e os estúdios de Hollywood. Incapaz de derrotá-los em próprio solo brasileiro, a Globo partiu para uma estratégia defensiva-ofensiva. Por pressão da Globo, a Lei 12.485 praticamente excluiu as operadoras de telecomunicações do mercado de mídia. Elas não podem ter mais do que 30% de produtoras e programadoras de TV paga e emissoras de TV aberta. E também não podem contratar os direitos de eventos de “interesse nacional” (como o Campeonato Brasileiro de futebol, a Copa do Mundo, as Olimpíadas e o carnaval da Sapucaí) ou “talentos” brasileiros (como artistas, diretores e roteiristas – exceto quando for para publicidade). Ao mesmo tempo em que constrói uma barreira contra as teles, a Globo segue associada ao grupo DirecTV (na Sky brasileira) e à America Movil (na NET).
A mesma estratégia foi adotada diante das majors norte-americanas. A Globosat mantém uma associação com Universal, Paramount, Fox, MGM e Disney nos canais Telecine, além de servir de segunda janela para a Sony-Columbia no Megapix. Mas, mantém poder de veto aos canais estrangeiros na Sky e na NET.
Com isso, a Globo busca ser um ponto de passagem obrigatório no mercado brasileiro, tentando se manter como o parceiro ideal para esses grupos transnacionais, ao mesmo tempo em que lhes dificulta a concorrência.
A estratégia é inteligente e por enquanto vem dando certo. Mas, até quando? Ao mesmo tempo, ela é sintoma de um duplo fracasso das políticas (ou da falta delas) para as comunicações brasileiras. Exceto pela Globo (e em parte por causa dela), o país não foi capaz de criar grupos fortes de comunicação. E nossa “campeã nacional” precisa lançar mão de uma série de expedientes para impedir a concorrência estrangeira.
Conforme Gindre, a estratégia vem dando certo para a TV Globo, mas uma tempestade se forma no horizonte: a regulamentação dos meios de comunicação. Tema do próximo post. Clique aqui para ler.


*Texto publicado no FNDC em 05/12/2012 com o título: Sem a NET, a estratégia da Globo para enfrentar o futuro. Clique aqui para ler

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